A Inconstitucionalidade da Demissão Automática dos Servidores Aposentados após a Reforma da Previdência

A constituição garante o direito ao trabalho e a relação de emprego, inclusive aos servidores públicos celetistas, e o novo parágrafo 14 do art. 37 da CF afronta diretamente esta cláusula pétrea.

A Reforma da Previdência, instituída pela Emenda Constitucional 103/2019, vigente desde 13.11.2019 incluiu ao art. 37 da Constituição Federal o §14, que assim estabelece:

“§ 14. A aposentadoria concedida com a utilização de tempo de contribuição decorrente de cargo, emprego ou função pública, inclusive do Regime Geral de Previdência Social, acarretará o rompimento do vínculo que gerou o referido tempo de contribuição.”

 

A reforma da previdência estabeleceu que o vínculo de emprego dos servidores públicos, em que o vínculo laboral é regido pela CLT, será rompido quando da concessão de aposentadoria, ou seja, a Constituição Federal passou a prever expressamente a extinção automática do contrato de trabalho dos servidores públicos celetistas.

Ocorre que não é de hoje que existem discussões sobre a dispensa dos servidores públicos celetistas quando da aposentadoria, no passado, o Supremo Tribunal Federal declarou inconstitucional o § 2º do art. 453 da CLT, que também previa a demissão voluntária do empregado quando aposentado, e à época o STF decidiu que “A mera concessão da aposentadoria voluntária ao trabalhador não tem por efeito extinguir, instantânea e automaticamente, o seu vínculo de emprego.” (Ação Direta de Inconstitucionalidade nº. 1.721-3).

Mas, o STF havia compreendido que o rompimento automático do contrato decorrente de aposentadoria não era possível, pois a Constituição Federal não autorizava referida conduta, o que agora é previsto no §14 do art. 37.

Contudo, é necessário observar às cláusulas pétreas, que são normas da Constituição Federal que não podem ser alteradas de forma prejudicial, apenas podem ser melhoradas, e os demais direitos que ao longo do tempo são criados não podem contrariá-las.

Assim, se uma norma constitucional é criada, mas é incompatível com as chamadas cláusulas pétreas, esta norma é inconstitucional e a sua eficácia poderá ser discutida no judiciário.

O inciso IV, do §4º do art. 60 da Constituição Federal proíbe qualquer alteração da Constituição Federal que prejudique os direitos e garantias individuais, e por sua vez, o art. 7º, inciso I, estabelece:

 

“Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

I – relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos;”

 

Desta forma, a constituição garante o direito ao trabalho e a relação de emprego, inclusive aos servidores públicos celetistas, e o novo parágrafo 14 do art. 37 da CF afronta diretamente esta cláusula pétrea ao permitir a rescisão contratual da relação de emprego de forma imotivada do servidor público por concessão e aposentadoria, o que a torna inconstitucional.

Ainda, nossas leis devem ser regidas pelo principio da isonomia, onde todos devem ser tratados de forma igual, enquanto que o §14 trata dos servidores públicos celetistas aposentados de forma desigual aos demais aposentados da iniciativa privada, sendo que estes podem se aposentar e continuar trabalhando.

O Estado quando contrata pelo regime da CLT se equipara ao empregador comum e segue as mesmas regras contratuais daquele. E a CLT não prevê a dispensa automática por motivo de aposentadoria, pois é possível a dispensa do empregado apenas por justa causa, sem justa causa, por pedido do funcionário, acordo entre as partes e indireta (que ocorre quando o empregador comete alguma falta).

Assim, teremos ainda muitas discussões, debates e ações judiciais sobre a dispensa dos servidores públicos celetistas instituídos pela Reforma da Previdência, principalmente por se tratar de uma norma inconstitucional, e ferir princípios jurídicos.

Fique atento sempre aos seus direitos!!

**É importante observar que a dispensa do servidor público celetista alcança apenas aqueles aposentados nas normas da nova previdência, ou seja, aqueles cuja aposentadoria se deu nos termos da EC 103 de 2019.

Aos que já eram aposentados e aos que se aposentaram nos termos da lei anterior a Reforma da Previdência, não podem ser alcançados pela rescisão do contrato prevista no §14º do art. 37 da Constituição Federal.